As imagens lacustres
Historicamente,
os referenciais das águas dos rios, das
águas marinhas e das águas lacustres têm sido um aspecto fundamental na definição e ocupação dos espaços
geográficos alagoanos. Quanto a isto, as escritas da história serve de testemunho:
Se do Brasil inteiro que se formou à sombra
dos engenhos patriarcais de açúcar, pode-se dizer que a água foi um dos elementos mais nobres de sua paisagem, nas Alagoas –
uma terra de tantas lagoas, tantos rios, tantos riachos – a importância da água
foi máxima na caracterização do complexo agrário. Muitos foram os engenhos
alagoanos que, em vez de tomarem das famílias proprietárias, nomes de santos ou
de mulheres, foram buscar um tanto pagãmente na água suas denominações
(Diegues, 1980: 17, grifo nosso).
Ou
então:
Alagoas é, de fato e por antonomásia, uma
civilização da água: de chuvas, nas matas úmidas onde amadurecem os canaviais;
marinhas no recortado litoral de rios e esteiros de mangues; lacustres, nas
lagoas que se estendem esparsas de Maceió para o sul; fluviais, nas abundâncias
dos grandes rios – como o São Francisco – e nos pequenos rios onde medrou a
civilização do açúcar (Lindoso. 1985 : 50).
Mas
não só isto, uma vez que, o próprio nomear da coisa, o nome de Alagoas, teve
como nascedouro o olhar de quem primeiro mirou e deu nome à terra: Alagoas,
enquanto um nome de um lugar nascido das águas e que delas mesmas, águas,
seriam compostos os elementos nucleares da estética[1] de
Calunga de Jorge de Lima e se ofertaria enquanto uma dádiva aos poetas:
[1] Revelador desta ambiência pode ser
verificada através das escritas dos romances e crônicas que estavam sendo
escritos a partir da referência do imaginário local. Em 1932 é escrito Manguaba, romance de Pedro Nunes Vieira e também seria na consolidação
deste imaginário que posteriormente também seria escrito um livro de memórias, Mundaú
(1950) de Pedro de Carvalho Vilella.
Na introdução deste romance, Pedro Nunes Vieira vai oferecê-lo à:
À Maceió das ruas pobres,
dos biombos, da monotonia;
à Maceió dos pescadores e
dos canoeiros, dos estivadores e da gente humilde;
à Maceió das feiras de
Bebedouro e do Pharol, das festas do Major Bonifácio;
à Maceió das cheganças, dos
pastoris, dos fandangos e dos reisados (Vieira, 1932:3)
Os magros e românticos
coqueiros
Como todo habitante do
litoral
Têm olhares vagos e
perdidos para os horizontes
Tentadores
Que lhes torna mais
fatal e doloroso o sedentarismo
Das raízes.
|
e alongam acurvados e
contorcidos sobre as águas
Num gesto desesperador e
insatisfeito do adeus.
De adeus talvez mesmo
incompreendido
Até pelas canoas dos
viajantes abandonados
Onde só as velas brancas
cheias de vento a balançar. (...)
(Aloízio Blanco)
|
É
com este entendimento que deve ser compreendido o olhar de Zumba enquanto um
olhar rasurado das coisas alagoanas, um olhar derramado olhar por sobre Reminiscências por dentre a conjunção da jangada e seu espelhos bem perto de pequenos
casebres, podemos quase que sentir os ventos do passado evocando antigas
memória dos universos lacustres. O
sentido é o mesmo, em seu Canais e Lagoas, quando pensamos
serem através deles, Canais e Lagoas,
a geografia primitiva por onde se deslocavam os antigos habitantes das
históricas e centenárias cidades de Coqueiro
Seco, Santa Luzia do Norte, Marechal Deodoro e Pilar em suas visitações à cidade de Maceió, e, poeticamente em Rastros de Sol, compondo o cenário das imagens lacustres, a imagem de um
poente-nascente nas beiradas da Mundaú-manguaba, ou ainda, a surreal imagem de Luar na Mundaú aonde
se vê uma jangada navegando por entre um rastro de luz de lua cheia.
No
encaminhar do vestimento das imagens geográficas nuas, os seus habitantes: O tarrefeiro, Um popular lacustre: o canoeiro,
O Vendedor de peixe, e, finalmente, uma emblemática personagem
daquelas paragens, um pescador Artesanando a rede.
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Por aí podemos perceber a emergência e densidade do simbólico lacustre nos contornos de nossa ambiência cultural, quando verificamos a ausência do registro destes romances nos livros específicos sobre a literatura alagoana, fato que em si mesmo é revelador da visibilidade e dizibilidades dos espaços lacustres.
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